A Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais, na sessão do dia 11 de setembro, reafirmou a tese de que se a perícia judicial não fixa a data de início da incapacidade nos casos de restabelecimento de auxílio-doença, e se o estado atual decorre da mesma enfermidade que justificou a concessão do benefício que se pretende restabelecer, presume-se a continuidade do estado incapacitante desde a data do cancelamento. Isso significa, na prática, que o INSS, além de restabelecer o benefício, deve efetuar o pagamento das parcelas correspondentes ao período em que o benefício ficou indevidamente suspenso.
O colegiado chegou a essa conclusão ao julgar o pedido de um segurado que teve o pagamento do auxílio-doença interrompido pelo INSS, e precisou recorrer à Justiça para restabelecê-lo. Na TNU, o autor pretende modificar o acórdão proferido pela 4ª Turma Recursal do Estado de São Paulo, que manteve, pelos próprios fundamentos, a sentença que determinou o restabelecimento do auxílio-doença, mas fixou os efeitos financeiros a partir do ajuizamento da ação.
Segundo os autos, o laudo concluiu pela incapacidade do requerente com base na existência de hiperlordose lombar, déficit auditivo bilateral e status pós-operatório tardio – as mesmas causas que deram margem à concessão do benefício cancelado. Diante de tal fato, para o juiz federal Bruno Carrá, autor do voto condutor do acórdão, encontra-se evidenciado nos autos, de maneira clara, que a doença que ensejou a incapacidade era a mesma que serviu de base para a concessão administrativa do benefício. Dessa forma, presume-se a continuidade da incapacidade desde o momento em que o INSS cancelou o benefício, gerando o direito de se receber os atrasados desde então.
Aplicação imediata do direito
Acontece que, após estabelecida a premissa jurídica, o Colegiado se deparou com outra questão levantada pelo juiz Bruno Carrá. Desta vez, a problemática posta em análise foi a possibilidade de se aplicar o direito de forma imediata, mas sem que ficasse caracterizado o revolvimento das provas, vedado pela Questão de Ordem 20 da TNU (“Se a Turma Nacional decidir que o incidente de uniformização deva ser conhecido e provido no que toca a matéria de direito e se tal conclusão importar na necessidade de exame de provas sobre matéria de fato, que foram requeridas e não produzidas, ou foram produzidas e não apreciadas pelas instâncias inferiores, a sentença ou acórdão da Turma Recursal deverá ser anulado para que tais provas sejam produzidas ou apreciadas, ficando o juiz de 1º grau e a respectiva Turma Recursal vinculados ao entendimento da Turma Nacional sobre a matéria de direito”).
Segundo o magistrado que redigiu o acórdão, isso é possível no caso dos autos, uma vez que a proibição de se apreciar a matéria de fato difere da possibilidade de fazer incidir o Direito sobre aquelas situações onde o quadro de fundo já se encontra estabilizado pelas instâncias inferiores. “O que se veda é que a Turma Nacional se converta em uma terceira instância a apreciar valorativamente a conjuntura fática da lide, ou seja, a reexaminá-la”, explicou. Para ele, “isso não ocorre quando os fatos são encaminhados à instância especial como incontroversos. Ocorrendo essa situação, não há revolvimento ou reexame de fatos, existindo tão-somente a aplicação do direito perante uma descrição factual perenizada”.
Ainda para Bruno Carrá, sempre que a aplicação do direito não depender da revisitação do quadro fático apurado na sentença e no acórdão, a Turma Nacional de Uniformização já poderá substituir-se ao julgamento levado a efeito pela Turma Recursal de origem sem precisar anular o respectivo acórdão. “Essa forma de proceder é incomparavelmente mais vantajosa, visto favorecer a rapidez e a efetividade do processo, bem como permitir um controle mais verdadeiro por parte desta Turma Nacional daquilo que é por ela deliberado. Desse modo, insisto, sempre que este Órgão se deparar com uma situação onde os fatos sejam incontroversos, porque, de acordo com as regras processuais, foram expressamente apreciados ou não foram impugnados pelos contendores, poderá aplicar o direito de forma imediata”.
Para o magistrado, o processo em análise se enquadra nessa hipótese. “Não houve impugnação das partes quanto a qualquer um desses aspectos de natureza factual, seja em contestação seja em recurso inominado contra a sentença, razão pela qual os mesmos podem ser considerados como incontroversos diante dessa instância especial. Nesses termos, parece razoável determinar de imediato a incidência da regra de interpretação admitida pela TNU e, segundo a qual, diante da identidade e persistência das enfermidades reconhecidas pela Administração e pelo laudo pericial, faz-se devido o pagamento dos atrasados desde a data da cessação indevida”, pontuou Bruno Carrá.
Processo 0013873-13.2007.4.03.6302
Fonte: Ascom/CJF