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Em decisão inédita, TJSC determina que poder público deve arcar com despesas com medicamentos

26/11/2016, publicado por

O Estado de Santa Catarina e o município de Agronômica são responsáveis pelos custos com remédios do morador Luis Carlos da Silva, 59 anos. A decisão do Grupo de Câmaras de Direito Público no Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), em sessão realizada na manhã de quarta-feira, afeta outros 30 mil catarinenses. Tratado como Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), dispositivo previsto no novo Código de Processo Civil (CPC), o caso deve ter repercussão vinculatória, servindo de parâmetro para decisões em outros processos semelhantes no Estado. De acordo com a Secretaria de Estado de Saúde, esses processos atingem cerca de R$ 160 milhões do orçamento da pasta por ano.

A partir da decisão dos desembargadores da Câmara de Direito Público do TJSC, outros processos relacionados ao mesmo tema devem ter o mesmo destino, com o Estado tendo que arcar com as custas ou fornecimento dos medicamentos para pacientes. No entanto, há uma diferença na obrigatoriedade dos pedidos. Se o remédio requisitado estiver padronizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), o paciente precisa ter procurado antes da secretaria de Saúde municipal ou Estadual e não há a necessidade de comprovar falta de recursos.

Já nos casos de medicamentos fora da padronização do SUS, o cidadão precisa comprovar falta de condição financeira para arcar com o custeio do remédio, além de comprovar que o tratamento sobre a doença ofertado pelo poder público é ineficiente ou não existe. Em todos os casos, é preciso apresentar um pedido formal de um farmacêutico e um médico.

Este foi o primeiro caso de IRDR julgado no país. A medida é prevista no novo CPC, em vigor desde março deste ano. Para ser enquadrado como Incidente, o processo deve ser sobre um tema recorrente, pois a criação de uma jurisprudência pode ajudar na isonomia das ações.

O caso

Com histórico de problemas cardíacos, Luis Carlos descobriu que tinha diabetes no começo de 2014. Com o novo problema de saúde, passou a tomar 18 pílulas por dia. Na época, percebeu que os custos com remédios seriam altos, então foi orientado a acionar a Justiça para ter os medicamentos custeados pelo Estado. Menos de seis meses depois, conseguiu uma liminar favorável no TJSC e começou a buscar os remédios na Secretaria de Saúde de Agronômica. Desde então, reclama que o serviço de fornecimento falhou algumas vezes, obrigando ele a pagar cerca de R$ 400 por mês com as pílulas.

— Eu tomo seis remédios no começo do dia, seis às 12h e outros seis de noite. Esse processo eu entrei apenas para os medicamentos da diabetes, porque o custo é bem alto. Mesmo com a decisão liminar, nem sempre os remédios ficam disponíveis, então tenho que pagar — afirma Luis Carlos da Silva.

Judicialização da saúde 

O secretário de Saúde João Paulo Kleinübing afirma que a decisão pode ajudar no planejamento da pasta. Ele afirma que a judicialização da saúde é um dos problemas financeiros mais delicados no setor. Só em processos movidos por pacientes em busca de medicamentos, alguns para doenças raras, o Estado gastaria cerca de R$ 160 milhões por ano.

— O que o TJSC fez foi estabelecer um critério, principalmente para os casos de remédios não padronizados pelo SUS, que representam a grande maioria dos processos sobre este tema.Isso já é um avanço. Nossa pasta tem orçamento de cerca de R$ 2 bilhões por ano, sendo a metade para folha de pagamento. Ou seja, os R$ 160 milhões que gastamos anualmente com judicialização chegam a quase 20% do orçamento. Isso precisa mudar — comenta Kleinübing.

ENTREVISTA: Desembargador Ronei Danielli

Relator do processo julgado pela Câmara de Direito Público do TJSC, o desembargador Ronei Danielli concedeu uma entrevista para explicar o impacto do IRDR julgado na quarta-feira:

DC – A decisão do TJSC, que seguiu seu voto como relator, estabelece uma diferença entre os tipos de medicamentos pedidos judicialmente. Por quê? 

Abordamos duas teses jurídicas nesse processo. A primeira sobre os medicamentos que constam na lista relacionada pelo SUS. Quando houver uma situação dessa natureza, o juiz deve cobrar a necessidade da enfermidade ser atestada por um médico e a impossibilidade pela via administrativa. Esta última é por que em muitos casos o paciente procura a Justiça antes mesmo de ir ao posto de saúde. Além disso, não é preciso comprovar falta de recursos. Para medicamentos não padronizados, estabelecemos mais critérios. Há vários casos que em que o Estado oferece um medicamento mas o cidadão quer outro que afirma ser melhor. Para ter acesso a esse remédio, o paciente precisa comprovar que o tratamento não é suficientemente. Além disso, ele precisa comprovar que não tem dinheiro para bancar o tratamento. Constatamos que em 90% desses processos quem entra na Justiça não é uma pessoa carente, então a pessoa que realmente precisa poderia estar sendo prejudicada por quem pode pagar pelas despesas. Foi a forma que encontramos para estabelecer um critério mínimo. No final as contas, todos nós gostaríamos que a saúde fosse perfeita e pudesse atender a todos, mas o orçamento não comporta isso.

DC – O que torna esta decisão diferente dos demais casos?

O Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) é um dispositivo implementado pelo novo CPC, em vigor desde março deste ano. Até esta quarta-feira, o que poderia haver é casos semelhantes terem tratamento diferente. Com este IRDR, que é o primeiro do país, isso vai terminar. O efeito desta decisão é imediato, então a partir de agora, quando o processo na Justiça catarinense se tratar de uma matéria semelhante, a decisão terá que ser idêntica. Isso é obrigatório. Se algum juiz ou desembargador decidir contrariamente, a parte prejudicada pode entrar com uma reclamação no TJSC e a decisão será imediatamente cassada. Por isso, quando instauramos a IRDR, todos os processos semelhantes foram suspensos para aguardar a decisão de hoje.

DC – Quantos processos semelhantes tramitam no TJSC atualmente?

Tramitam quase 30 mil processos sobre pedidos de remédios e tratamento médico na jurisdição estadual. Por mês, pelo menos 800 novos casos são protocolados. Com essa decisão, acredito que haverá uma rapidez maior no julgamento dos casos. Isso ajuda o Judiciário e também o Executivo que poderão se planejar melhor.

Fonte: ClicRBS