Se você ainda não tem idade para se aposentar precisa estar muito atento aos movimentos em Brasília: dependendo da posição de senadores e da presidente Dilma Rousseff, seu benefício pode ser concedido até sete anos antes e gerar uma renda até R$ 87 mil maior.
Tramita no Congresso a emenda constitucional que flexibiliza o fator previdenciário, cálculo atual que rege as aposentadorias. Se a nova regra for aprovada – a contragosto da Presidência da República –, o cálculo muda e quem contribuiu por mais tempo poderá tirar proveito disso para se aposentar mais cedo.
O fator previdenciário vale desde 1999. Com esse cálculo, quem se aposenta por tempo de contribuição (35 anos para homens e 30 para mulheres) tem corte no benefício a receber (cerca de 40%, em média). Para não ter redução, é preciso esperar até a idade mínima, que é 60 anos no caso das mulheres, e 65 anos para homens.
Na semana passada, os deputados federais aprovaram a emenda que cria a regra 85/95. Ela ainda precisa passar pelos senadores e pela Presidência da República. Com a mudança, o tempo de contribuição passaria a ter um peso maior. O cálculo é simples: soma-se o tempo em que a pessoa pagou a contribuição com a idade. Se essa conta der 85 anos, para mulheres, e 95 anos, para homens, já é possível se aposentar com o valor integral do benefício, mesmo que ainda não se tenha atingido a idade mínima. Para quem não obtiver o 85/95, fica valendo o fator previdenciário.
SETE ANOS – Cálculos feitos recentemente pelo Instituto de Estudos Previdenciários (Ieprev) mostram que mulheres podem se aposentar até sete anos mais cedo caso a 85/95 seja aprovada. Para os homens, esse adiantamento seria de até quatro anos. Isso ocorre porque a nova regra reduz a idade necessária para a aposentadoria à medida que o tempo de contribuição aumenta. Assim, enquanto um homem de 50 anos que contribuiu com o INSS por 15 anos teria que esperar mais nove anos para se aposentar integralmente via fator previdenciário, na 85/95 ele precisaria esperar somente cinco anos.
O levantamento foi feito por um dos diretores do instituto, Luiz Felipe Pereira Veríssimo, e fez simulações para homens e mulheres, no sistema atual e no 85/95. No infográfico, está um exemplo bem simples. Veríssimo considerou um benefício mensal de R$ 1.500. Quando é usado somente o fator, o contribuinte perde dinheiro. No caso do quadro, sem a regra nova, esse homem deixará de receber R$ 8.757 caso se aposente nessas condições.
Esse valor corresponde à diferença entre a aposentadoria integral (R$ 1.500), dentro do 85/95, e a proporcional (R$ 1.275,45), dentro do fator previdenciário. O resultado dessa conta dá R$ 224,55, que foi multiplicado por 39 meses (três anos de benefício mais três 13º salários), que é o tempo em que ele poderia estar aposentado e não está. Nessa mesma lógica, o valor mais alto é de uma mulher de 47 anos com 17 anos de pagamentos: se na 85/95 ela esperaria somente quatro anos para se aposentar, nos critérios atuais seriam 11. Dessa forma, ela deixaria de ganhar nada menos que R$ 87.387,30. Sem falar que continuará contribuindo por mais sete anos.
TENSÃO – Os benefícios da 85/95 aos trabalhadores são o ponto de maior tensão para o governo petista. Quando o fator previdenciário foi criado, o PT foi radicalmente contra, justamente pelo prejuízo a quem contribui durante décadas a fio e vê seu benefício cortado por causa da sua idade. O argumento do governo Fernando Henrique Cardoso, porém, foi mais forte: com o avanço da expectativa de vida, era preciso desestimular as pessoas a se aposentarem ainda em idade produtiva, visando o equilíbrio financeiro das contas da Previdência Social.
Hoje, às voltas com a imperativa necessidade de reduzir custos, a presidenta Dilma Rousseff pretende barrar a nova regra para não dar mais vazão ao abismo do déficit da previdência.
Todo esse contexto tem um tom irônico porque a proposta, elaborada pelo deputado Arnaldo Faria de Sá (PTB SP), integra a Medida Provisória 664, parte do pacote de ajuste fiscal que o governo federal está aplicando para contornar a crise econômica do País. De um lado, a oposição usa a incoerência histórica do governo para se colocar a favor da 85/95; de outro, petistas que se mantêm na defesa dos direitos dos trabalhadores também apoiam a medida. Fora da política, entidades como a Central Única dos Trabalhadores também já se manifestaram favoráveis à alteração.
Agora, a emenda está no Senado. A expectativa é que a nova regra tenha entre os senadores movimento semelhante ao que provocou na Câmara: votação apertada. A maior apreensão, no entanto, é se Dilma Rousseff vai ou não encarar a impopularidade do veto.
DÉFICIT – Para o advogado especialista em direito tributário e um dos diretores do Ieprev, Pedro Saglioni, a 85/95 é a alternativa que pode ajustar melhor os interesses do governo e dos trabalhadores. Em relação ao déficit da previdência, – hoje em R$ 66,7 bilhões e principal argumento para não aprovar a mudança nas regras da aposentadoria –, Fonseca reforça o que o superintendente regional do INSS, João Maria Lopes, já destacou em entrevista ao JC: os contribuições “urbanas”, essas que estão sujeitas ao fator e à 85/95, não são o problema; atualmente o rombo vem basicamente das aposentadorias rurais, que não têm o lastro do pagamento mensal. Os benefícios rurais são concedidos a pessoas que nunca contribuíram e os recursos para eles vêm de aportes do governo.
Quando se coloca em uma perspectiva futura, com a longevidade aumentando, outro entrave atual se destaca: o alto índice de informalidade, de “urbanos” que não contribuem. “As pessoas desconfiam do sistema, tanto que se aposentam com perdas com o sistema atual. Elas não sabem se as regras vão mudar para pior”, comenta o advogado. Para ele, os esforços devem ser para atrair a população a contribuir, mesmo que em valores mínimos, para que a conta previdenciária possa fechar.
FONTE: JORNAL DO COMERCIO